A águia branca-e-preta sobrevoava. De um lado à outro no céu, transportando carcaças em suas garras.
Passou longe; sobre a planície. Tudo parecia calmo e normal, quando vi um vulto com o canto do olho, bem depois de já ter sentido o que viria…
Num vôo rasante toca-me no rosto com suas penas vermelhas úmidas de sangue.
Agacho-me. Escondo-me debaixo da cama branca. Fecho bem os olhos. Finjo estar ausente. Quem sabe ela me ignora.
Não ignora não. Vem e cutuca minha cara com seu bico enorme e curvo. Morde-me a orelha. Irrito-me. Angustiado…
Pronto, feito. Ela então se vai.
Veio só pra lembrar-me que habita o céu da minha memória e fixar a impressão de que sua maldade é infinita e eternamente presente sob o Desejo Maior.
Olhos entre-abertos. Levanto-me e ando pela vida a fora. Exausto e irado. Regando ressentimento em cada encontro. Uma rejeição profunda do coração humano. Uma dor velha que me persegue e oculta a paz…